Friday, October 14, 2005

Retrato de um príncipe adormecido

Photo de Camilo Margeli


Constróis o teu casulo em seda espessa até sentires encoberta a existência; depois imaginas que nasceste num país todo coberto de neblina e é de névoas que fazes os teus dias.
Os bens nada te dizem de importante. Despojas-te do oiro, temendo ser um príncipe, antecipas o gelo com medo dos braseiros e apagas os incêndios à nascença; quando nos teus dedos nascem horizontes foges dos sentidos cobrindo os olhos com remendos tecidos do brilho das estrelas. Recusas a caligrafia demorada das palavras imaginando que elas denunciam a tua sede no caule de cada rebento novo; e vais secando, na alma, a terra das sementes que trazem a cor da lua. Temes, ainda, os salpicos da água no teu corpo sonolento e deitas-te protegido pelas dunas.
Se pudesse coroava-te de todas as flores e assobiava, num búzio, o chilreio das aves à beira-mar; parava os gestos na escultura do teu corpo e ficava a teu lado sem te chamar solidão. Depois fechava a noite no silêncio e levantava as brumas entoando madrigais de encanto, horas e horas sem fim, enquanto dormias.

16 comments:

mfc said...

A elegia do desprendimento, um texto muito bonito!

Unknown said...

Há 'blogs' que têm música. Aqui não é necessário. Sai dos textos uma melodia que fica a ecoar nos ouvidos e um ritmo que faz vibrar a emoção. Obrigado!

jp(JoanaPestana) said...

Terna senhora que desenhais palavras.
Nem sei que te diga depois do elogio tecido. Fiquei obtusa. Eu que por norma me minimizo, evocações menosprezantes de infância, ler que escrevi com mão de artesã a escrita madura...
Regenera-me o ego as tuas palavras.
Compreendo o teu constrangimento, eu é mais ao vivo e a cores ;-)
Mas nestes últimos anos aprendi a verbalizar o que sinto. Trouxe-me muitos dissabores, mas exultantes vitórias. Cada um é como é, e a graça está toda aí.
Habituei-me a dizer quando gosto, e gosto muito do que também escreves.
Viva a vencedora!
Bebe um copinho por moi
Beijo grande e obrigado

André L said...

Olá, já cá tinha passado e não foi por falta de coragem. Sai do teu blog tão completo de palavras e sentidos que egoistamente guardei tudo para mim. Voltei para dar-te os parabéns no blog do MRF. Acho sinceramente que foi merecido, gosto de cá passar, e se não te importas, sinto-me em casa :oP
Em linhas vejo outros sentidos.
Resto de bom fim de semana

Elipse said...

...benvindos. E obrigada. :)

Anonymous said...

Parabéns tenho eu a dar-lhe pela forma maravilhosa como escreve, pelo blog e pelo prémio tb, já agora :-) Parabéns não será talvez a palavra mais adequada para alguém que tem o talento nato de transmitir cor, movimento e sentimento com palavras. Mas creio que dizer-lhe que se fica maravilhada é mais adequado. Um beijo!

Luis Oliveira said...

Cachopa

Queres que os nosso 2 blogues se linkem?
Beijos

Anonymous said...

Cachopa

Queres que os nosso 2 blogues se linkem?
Beijos

Elipse said...

Vamos a isso luís.

Luis Oliveira said...

Vou linkar-te agora.
Tu também, certo?
Para este endereço lco@netvisao.pt pode-se saber o nome?
Beijos

Luis Oliveira said...

Já estás linkada!
Beijokas

Maria Heli said...

Esta-se muito bem por aqui! Um caminho a fazer mais vezes...até chegar um novo encontro "real", onde tb te queremos presente :)

Maria do Rosário Sousa Fardilha said...

Este texto é muito bonito. Eu li alguém que foge da entrega. E li alguém que cobre um amante que desconcerta... com beleza.

bj

Elipse said...

Nem sempre nos escrevemos a nós. Ficcionar é mais do que isso.

Tino said...

Verdade ou ficção,nunca sai de nós algo que não faça parte da nossa própria alma.beijinho :)

Graca Neves - mgbon said...

Que lindo texto.